Nos últimos dias eu tenho lido e ouvido pessoas falando sobre
o caso recente de estupro coletivo, onde cerca de 30 homens violaram uma
adolescente indefesa. Fico imaginado como não ser considerada indefesa numa
situação dessas: uma mulher contra 30 homens.
Estupros coletivos não são uma novidade. Embora não se faça
alarde sobre eles, são comuns desde a antiguidade e característicos de tempos
de guerra. Os assírios os praticavam, os romanos os praticavam e os chamados povos
bárbaros, também. Na Idade Média e na Idade Moderna não foi diferente.
Recordei-me do caso dos estupros coletivos na II Guerra
Mundial, em especial o das mulheres alemãs. Pra quem não sabe, cerca de dois
milhões de alemãs foram violadas ao final da II Guerra Mundial. Dos algozes os
mais lembrados são os soviéticos. Ao invadirem Berlim eles levaram mulheres de
8 a 80 anos para as ruas e as violentaram em público, por vezes seguidas.
Muitas se suicidam para não serem violadas, outras se suicidaram após terem
sido violentadas por até mais de 12 vezes seguidas, durante vários dias.
As mulheres não declararam guerra, a esmagadora maioria delas
não esteve no campo de batalha, mas elas tiveram que pagar pelas ações dos
homens, concordando com eles ou não. Dois milhões de mulheres sofreram um dos
mais profundos traumas que uma mulher pode sofrer. E não
estamos contabilizando aqui as prisioneiras de campos de concentração, as francesas
durante a ocupação nazista e durante a desocupação pelas tropas aliadas.
Se a II Guerra Mundial foi marcada pelo holocausto dos
judeus, penso na mesma palavra para com as mulheres, milhões delas, que tiveram
sua vida marcada pela violência física e psicológica. Não seriam elas também
vítimas de um tipo de holocausto? Um que mata a dignidade e que tira de muitas
de suas vítimas a vontade de viver, de conviver com as lembranças do horror
sofrido.
Vamos falar de tempos recentes, quando meninas e mulheres são
violadas diariamente, em países que vivem imersos em conflitos. Um dos maiores
carrascos da atualidade é Estado Islâmico que sequestra, violenta e mata mulheres
em ações que chocam todo o mundo, e para as quais não se encontra defesa. Sobreviventes
narram os horrores de estupros coletivos e de abortos forçados. Muitas são
vendidas como escravas sexuais.
Essas mulheres e meninas são tiradas a força de suas casas,
de suas famílias. O horror sofrido por elas é o mesmo sofrido pelas indianas,
violadas em ônibus e becos escuros, simplesmente porque estão à disposição dos
homens, ou eles assim pensam. Elas não estão em áreas de guerra, mas elas convivem
com o medo deste tipo de violência porque são mulheres.
Nenhuma mulher pede para ser violada. Nenhuma mulher pede
para ser agredida. E para os e as machistas de plantão que acham que a roupa que algumas mulheres usam atraem homens violentos, que
essas mulheres por seu comportamento criam situações que levam ao estupro,
saibam que a grande maioria das mulheres violadas não estava expondo seu corpo
nem em situações que, de alguma forma, em alguma mente doentia, justificasse
tal absurdo.
Vivemos num mundo doente, numa sociedade que não consegue ou
não se esforça verdadeiramente para deter o que tem se chamado de cultura do estupro. Os corpos femininos
não têm dono, são públicos. Eles não sentem, eles não importam. Mesmo sabendo
que a maioria dos homens não concorda com isso, eles também não tomam atitudes a este
respeito. Muitos, homens e mulheres, justificam essa violência, talvez para
mascarar a vergonha de não ter coragem de agir contra ela.
"Não concordo com isso, porém..."
"Não concordo com isso, porém..."
Temos que dar basta neste “porém”. Não deve haver justificativa,
deve haver punição e ela deve ser severa. Os homens têm que saber que serão
punidos e todos, homens e mulheres, têm que entender que não há justificativa
que valide tal ação. Nossos corpos não são públicos e nosso direito à dignidade
não nos pode ser privado por terceiros.
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