sábado, 1 de abril de 2017

HELENA FONSECA: DA SUPERAVENTURA AOS QUADRINHOS DE TERROR

Helena Fonseca é uma roteirista de histórias em quadrinhos brasileira, muito ativa entre os anos de 1960 e 1980. Trabalhou com vários gêneros, como aventura, superaventura e terror. Ela pode ser considerada uma das pioneiras dos quadrinhos brasileiros, tanto pela sua versatilidade, quanto pelo fato de ter desenvolvido roteiros para gêneros dos quadrinhos onde as mulheres nem sempre conseguiam se destacar. Pelo menos é o que afirma o senso comum.

Entretanto, pesquisas recentes têm mostrado que a participação feminina na indústria dos quadrinhos é muito maior do que se pensava. No Brasil, temos exemplos de mulheres que se destacam na produção de quadrinhos de terror, aventura e superaventura. Algumas estão até conquistando espaço no mercado externo, como é o caso de autoras como Erika Awano e Bilquis Evely.

Mas, no que diz respeito à memória dos quadrinhos nacionais, muito tem sido perdido e precisa ser recuperado para que se construa uma História dos Quadrinhos no Brasil que possa servir de referência para as futuras gerações. No que diz respeito à produção feminina, a construção desta memória é muito carente. Muitas quadrinistas foram esquecidas pela história, apesar da sua ampla participação na produção nacional.

É o caso de Helena Fonseca. Ela, por exemplo, não possui um verbete na Enciclopédia dos Quadrinhos, de André Kleinert, ampliada em 2014. Mesmo na internet são poucas as referências feitas à sua produção, tendo sua biografia pouco mais de que oito linhas, na Wikiwand. A princípio, pode-se concluir que não há informações disponíveis sobre a autora. Mas realizando um trabalho quase arqueológico, é possível montar um perfil mais detalhado sobre a produção desta quadrinista que, certamente, vai ocupar mais do que oito linhas.

Publicado em outubro de 1967.
Começando pelos quadrinhos de superaventura, Helena Fonseca escreveu roteiros para a revista do Capitão 7, um dos heróis nacionais mais antigos das HQs brasileiras. O Capitão 7 surgiu no início dos anos 1950 como um personagem da TV Record de São Paulo, em 1954. “Foi criado pelo ator e boxeador Ayres Campos, que também o interpretava. O número sete era por causa do canal. Assim, todos associavam o Capitão Sete, como o "herói da Record", herói do 7".[1] Em 1959 ele se tornou herói dos quadrinhos pela editora Continental/Outubro (que em 1966 trocou de nome e se tornou a Editora Taika). Os quadrinhos eram foram desenhados por vários artistas e os roteiros ficaram por conta de Helena Fonseca, Hélio Porto e Gedeone Malagola.

Uma referência ao personagem Capitão 7 está no livro Esses Incríveis heróis de papel, de Ionaldo A. Cavacalti, publicado em 1988. Nele há um breve parágrafo sobre o personagem, mas o nome de Helena Fonseca não é citado, apenas dos desenhistas e capistas. Já o livro A magia da nona arte, de Israel Forguel, publicado em 2016, já faz uma breve referência aos roteiros feitos por Helena Fonseca para este personagem. O nome de Helena Fonseca foi esquecido numa época em que ela ainda era uma autora ativa, e resgatado em obra recente sobre quadrinhos.

Publicado em agosto de 1974.
Helena também foi uma das principais roteiristas das histórias em quadrinhos de Targo, a versão brasileira de Tarzan. Talvez nenhum personagem clássico dos quadrinhos tenha sido tão imitado quanto o rei das selvas. No Brasil, a editora Outubro lançou o tarzanide brasileiro em meados década de 1960[2]. O personagem foi criado por Heli Otávio de Moura Lacerda e desenhado e roteirizado por vários quadrinistas, principalmente Helena Fonseca.

"Seus roteiros eram quase sempre de Helena Fonseca e Francisco de Assis, mas houve outros escritores, e todos tentavam imprimir no herói alguma característica brasileira, visto que na época (ao contrário de hoje), os leitores se identificavam com personagens que explorassem coisas nossas[3]".

Sem data exata de publicação.
Sua participação nos quadrinhos de terror também foi marcante. Helena Fonseca, juntamente com Nico Rosso, criou Naiara, A Filha do Drácula, uma personagem de terror brasileira. Helena já escrevia roteiros para os quadrinhos de Drácula. Ela ajudou a dar ao personagem clássico de terror características bem diferentes daquelas do original do livro de Bram Stoker.

Naiara é a filha rebelde de Drácula, bem no espírito dos anos do final dos anos de 1960. A vampira faz de tudo para contrariar o pai e fugir da sua autoridade. Ela bebia o sangue das suas vítimas em uma grande taça de cristal[4]. O erotismo presente em suas histórias é uma das suas principais características, o que a classificava como sendo um quadrinho para adultos. 

O terror foi um gênero que se difundiu muito no Brasil, nos anos de 1970. Era marcado por cenas de violência, nudez e muito erotismo. Também foi gênero onde as mulheres se destacaram. Ainda no gênero terror ela colaborou ainda para os títulos: Almanaque Clássicos do Terror, Almanaque do Drácula e Seleções de Terror. Além de Helena Fonseca tivemos ainda os contos de terror baseados em histórias do folclore local criadas por Maria Aparecida Godoy, a Cida Godoy.

Vampirella, capa de 1969.
Curiosamente, a personagem Naiara chegou às bancas em 1967, bem antes de Vampirella, personagem criada por Forrest J. Ackerman em 1969, com a ajuda Trina Robbins e Frank Frazetta.[5] Estas duas personagens, apesar de possuírem origens diferentes, apresentam muitas semelhanças como a sensualidade, o erotismo e até a gosto por roupas que valorizam os contornos do corpo.

Helena Fonseca também trabalhou com o gênero nordestern[6], ou gênero cangaço. Ela roteirizou as histórias de Juvêncio, o justiceiro do sertão. O personagem foi criado originalmente pelo jornalista Reinaldo Santos para um programa da Rádio Piratininga, de São Paulo, nos anos de 1960, apoiado no sucesso de outro personagem, de 1953, Jerônimo, o herói do sertão. Juvêncio era inspirado no Zorro, mas ao contrário daquele personagem, ele era um justiceiro: ele não prendia, ele matava bandidos[7].

Sem a data de publicação da revista.
A popularidade da radionovela do justiceiro nordestino acabou levando ao lançamento de uma revista em quadrinhos, em maio de 1968, pela editora Prelúdio. As histórias em quadrinhos do personagem foram desenhadas por Rodolfo Zalla, Eugênio Colonnese, Edmundo Rodrigues e roteirizado por Gedeone Malagola, Helena Fonseca, R. F. Lucchetti, entre outros. Seus quadrinhos foram publicados até agosto de 1969.

Helena trabalhou ainda em vários outros títulos escrevendo roteiros para personagens como Margarida, da Disney, e Os Trapalhões, ambas as revistas publicadas pela Editora Abril; roteirizou Simãozinho, quadrinho infantil publicado pela Editora Prelúdio; escreveu histórias para o Vigilante Rodoviário, publicado pela Editora Outubro/Taika.

Helena Fonseca esteve ativa até o final da década de 1980 e ganhou o Prêmio Angelo Agostini na categoria Mestre, em 1995. Produzindo para várias editoras em uma grande variedade de títulos, Helena Fonseca pode ser considerada uma das profissionais femininas mais bem sucedidas do Brasil.

REFERÊNCIAS

CAVACALTI, Ionaldo A. Esses Incríveis heróis de papel. São Paulo: Rd. Mater, 2016.

Conheça Targo (2012). Disponível em: http://blogmaniadegibi.com/2012/03/conheca-targo/, acesso em 1º abr. 2017.

FORGUEL, Israel. A Magia da Nona Arte. São Paulo: Clube de Autores, 2016.

Helena Fonseca. Disponível em: http://www.wikiwand.com/pt/Helena_Fonseca#/Refer.C3.AAncias, acesso em 1º abr. 2017.

Juvêncio, o justiceiro do sertão. Disponível em: http://www.wikiwand.com/pt/Juv%C3%AAncio,_o_justiceiro_do_sert%C3%A3o, acesso em 1º de abr. 2016.

Super heróis brasileiros de histórias em quadrinhos (2017). Disponível em: http://aminoapps.com/page/comics-portugues/1027610/super-herois-brasileiros-de-historias-em-quadrinhos, acesso em 1º abr. 2017.

UCHOA, Francisco. Naiara de presente (2012). Disponível em: https://planetamongo.wordpress.com/2012/01/23/naiara-de-presente/, acesso em 1º Abr. 2016.

Vampirella. Disponível em: https://pt.wikipedia.org/wiki/Vampirella#Vampirella_no_Brasil, acesso em 1º abr. 2016.





[1] Super-heróis brasileiros de histórias em quadrinhos. Disponível em: http://aminoapps.com/page/comics-portugues/1027610/super-herois-brasileiros-de-historias-em-quadrinhos, acesso em 1º abr. 2017.
[2] Não consegui encontrar a data exata do primeiro número do personagem. As referências são vagas e fala-se de meados de 1960. Como a revista já estava em seu n. 33  em setembro de 1967 e, supondo que era mensal e foi publicada sem interrupções, Targo deve ter sido lançado aproximadamente em dezembro de 1964.
[3] Conheça Targo. Disponível em: http://blogmaniadegibi.com/2012/03/conheca-targo/, acesso em 1º abr. 2017.
[4] UCHOA, Francisco. Naiara de presente (2012). Disponível em: https://planetamongo.wordpress.com/2012/01/23/naiara-de-presente/, acesso em 1º Abr. 2016.
[5] Vampirella. Disponível em: https://pt.wikipedia.org/wiki/Vampirella#Vampirella_no_Brasil, acesso em 1º abr. 2016.
[6] Como o próprio nome indica, são quadrinhos de faroeste cuja a ambientação é o sertão nordestino brasileiro.
[7] Juvêncio, o justiceiro do sertão. Disponível em: http://www.wikiwand.com/pt/Juv%C3%AAncio,_o_justiceiro_do_sert%C3%A3o, acesso em 1º de abr. 2016.

3 comentários:

Quiof disse...

Targo não foi criado pelo Gedeone Malagola, ele teria sugerido o nome por conta do sobrenome de um amigo da polícia (Targa) Fonte:Franco de Rosa (2008). «Wizmania (2ª versão) #6 - Homenagem a Gedeone Malagola, uma lenda dos gibis brasileiros». São Paulo: Panini Comics. pp. 56 a 59.

O Rodolfo Zalla disse que o nome Targo era pra confundir o leitor, pensando que estaria comprando Tarzan, para ele, quem criou foi o Heli Otávio de Moura Lacerda
No site da Memo Magazine tem dossiês sobre o Rodolfo Zalla e o Nico Rosso:
http://www.memomagazine.com.br/


http://web.archive.org/web/20080214140519/http://www.operagraphica.com.br/a_entrevista/entre_rodolfozalla.htm


Um tarzanide feito pelo Malagola foi o Tambu, ele também roteirizou histórias do Tor do Kubert
http://sallesfanzineiro.blogspot.com.br/2011/12/tambu-koreme.html

Natania A S Nogueira disse...

Valeu, vou arrumar!
:-)

Quiof disse...

Quando o Rodolfo Zalla começou, ele já tinha algumas histórias, pode-se dizer que foi uma criação conjunta dos editores e artistas da Outubro.