sexta-feira, 24 de janeiro de 2020

PASSANDO UM DIA EM COIMBRA (PORTUGAL)

No dia 04 de janeiro fui passar a Coimbra. Eu já a conhecia pois ano  passado, na mesma época, eu estive lá. Na ocasião eu fui a alguns dos pontos turísticos conhecidos e até visitei a Universidade de Coimbra. 

Mas desta vez eu estava acompanhada de um morador da cidade, João Miguel Lameiras,  o que, diga-se de passagem, torna a experiência muitos mais interessante. Por exemplo, descobri lugares que eu não teria encontrado se fizesse uma pesquisa simples na internet e ouvi histórias que só um ex-aluno da Universidade de Coimbra poderia me contar.

Vamos começar pelo básico, ou seja, apresentando Coimbra para quem nunca ouviu falar da cidade. Coimbra é uma cidade portuguesa que foi antiga capital do país, e é muito conhecida por ter sido palco da romance trágico de Inês de Castro e o D. Pedro I (não confundir com o nosso D. Pedro, que lá tinha o título de D, Pedro IV), imortalizado nos versos de Camões, em "Os Lusíadas". O local onde Inês morreu se tornou uma atração turística, a  Quinta das Lágrimas (clique aqui para conhecer a história). 

"Tu só, tu, puro Amor, com força crua,
Que os corações humanos tanto obriga,
Deste causa à molesta morte sua,
Como se fora pérfida inimiga.
Se dizem, fero Amor, que a sede tua
Nem com lágrimas tristes se mitiga,
É porque queres, áspero e tirano,
Tuas aras banhar em sangue humano."
Trecho de "Os Lusíadas", Luís de Camões, que faz referência ao amor trágico de Inês e Pedro.

Igreja/Mosteiro de Santa Cruz, onde está a sepultura de D, Afonso Henriques.
Lá também está o túmulo de D. Afonso Henriques, o primeiro rei e fundador de Portugal, na Igreja/Mosteiro de Santa Cruz. D. Afonso é lembrado na história por ter sido o primeiro rei a unificar feudos e a forma um Estado Nacional. Para quem gosta de história e literatura, como eu, Coimbra é um prato cheio.

A cidade fica no centro de Portugal, cortada pelo Rio Mondego, a uma distância de duas horas de comboio (trem), tanto saindo do Porto quanto de Lisboa. A viagem é confortável e a paisagem muito bonita.

Logo que cheguei fui conferir o mercado de pulgas, imenso, que estava instalado no entorno do Mosteiro de Santa Clara-A-Velha, um dos pontos turísticos famosos de Coimbra. Em estilo gótico, ele foi fundando no final do século XIII (13 de Abril de 1283), o mosteiro foi refundado no século XIV (10 de Abril de 1314), por Isabel de Aragão, que desejava ser enterrada naquele local, quando morresse. 

Pela sua proximidade com o rio o local estava constantemente sujeito a inundações o que acabou fazendo com que fosse abandonado em 1677. Mais acima foi construído outro convento, o Mosteiro de Santa Clara-a-Nova. Em 18 de abril de 2009, o local foi aberto para visitação pública.

Mercado de pulgas de Coimbra, com o Mosteiro Santa Clara-A-Velha ao fundo. Ao alto, à direita, está o Mosteiro de Santa Clara-Nova.
Eu realmente nunca tinha ido a um mercado de pulgas. Já havia visitado os  loppis, na Suécia, que são locais onde se vendem objetos usados e/ou antigos. Mas um mercado de pulgas, foi a primeira vez. Sei que eles existem em todo o mundo, atualmente, mas origem destas feiras é a França do século XIX. Foi uma experiência muito boa, tanto pelo que eu vi quanto pelo  fato de ter sido em Coimbra. Futuramente, quero visitar o mercado de pulgas de Paris. 

Dos vários locais para se visitar o que mais me interessava era a Universidade de Coimbra, uma das mais antigas do mundo (fundada em 1290, ou seja, ainda no século XII), e considerada, também uma das melhores. Atualmente ela possui quase 25.000 estudantes, de todo mundo. Muitos brasileiros, por sinal. Aliás, pode-se usar pontos do ENEM para entrar na Universidade de Coimbra. 
Vista de uma parte da Universidade de Coimbra.
Eu já havia visitado o campus central, que fica na parte alta da cidade, e até sua famosa biblioteca. Mas não tinha ainda me aventurado pelo becos e ruas, que também fazem parte do complexo, com seus bares e suas repúblicas. Achei fascinante. São aqueles detalhes que a gente deixa passar, como desenhos e frases deixadas nas paredes e muros que possuem significados que podem variar ou não, de acordo com a forma que o receptor as interpreta.

Quadrinhos desenhados nos muros de uma república de estudantes.
Acima dos quadrinhos, uma referência ao fim da ditadura fascista de Salazar.


Mais uma referência ao fim da ditadura e a conquista da democracia.
Possivelmente devido ao ambiente político quase apocalíptico no qual estamos vivendo, eu senti uma energia muito forte ali, que crescia quando eu lia frases antifascistas, que estavam a toda parte. Hoje eu estava lendo um artigo que afirmava que hoje Portugal é um país com uma democracia consolidada. 

Mas os portugueses sofreram muito nas mãos do fascismo para poder hoje comemorar a democracia. Do nosso lado, demoramos muito para tentar construir uma democracia, mas creio que usamos material de baixa qualidade, visto que tenho visto pessoas comemorando seu fim. A coitada, mal teve condições de se consolidar numa nação que ainda guarda e cultiva no seu cerne a herança da escravidão.

Andar pelas ruas de Coimbra e, principalmente, na área da universidade, foi como sentido o vento na liberdade, o coração aquecido, principalmente quando eu passava a frente das repúblicas, nas quais os estudantes, de forma bem divertida penduram objetos usados nas janelas como se estivessem me dizendo: olha aqui, somos livres! 
Fachada de uma república de estudantes.

Janela de uma república de estudantes - destaque para o gatinho que descansa entre as grades.
Por fim, para coroar o passeio, Lameiras nos levou ao Penedo da Saudade, um lugar mágico que não havia aparecido nas minha buscas  na internet quando pesquisei sobre a  cidade. O Penedo da Saudade é um parque miradouro do qual se pode ter uma vista belíssima da cidade. Ele foi construído em 1849 e está ligado à Universidade de Coimbra e seus estudantes.

Até o século XVI o local era conhecido como "Pedra dos Ventos" mas mudou de nome  para se tornar uma referência à trágica história de amor de Inês de Castro. Segundo lenda, foi na Pedra dos Ventos que D. Pedro se refugiu para chorar a morte da amada, por isso o local recebeu posteriormente o nome de Penedo da Saudade. Eu não poderia descrever o local, as placas, sua história como algo no mínimo fantástico e tocante. 





E, para encerrar o dia, eu consegui finalmente assistir a um lindo show de fado, tomando um taça de vinho em um lindo restaurante/pastelaria, O Café Santa Cruz, anexo à Igreja de Santa Cruz. É a segunda vez que fui a Coimbra, mas foram realmente duas experiências completamente diferentes. Desta vez havia algo mais, havia toda aquela energia que a Universidade e tudo que ela significa me envolvendo com mais força.  




Eu diria que meus Coimbra este ano serviram para refazer minhas energias e reforçar minhas convicções. Mais do que turismo foi uma viagem de esclarecimento, na qual eu pude ter a certeza de que a bolha de crueldade na qual vivemos no Brasil ainda não chegou ao refúgios sagrados do conhecimento, como a Universidade de Coimbra.

Meus agradecimentos especiais ao amigo João Miguel Lameiras, por um dos mais proveitosos dias que eu tive nestas curtas férias na Europa.

Fontes consultadas:
Mosteiro Santa Clara Velha. Disponível em: <https://www.culturacentro.gov.pt/mosteiro-santa-clara-a-velha/o-mosteiro/>. Acesso em 23 jan. 2020.

Universidade de Coimbra. Disponível em: <http://www.uc.pt/>. Acesso em 23 jan. 2020.

Penedo da Saudade. Disponível em: <https://pt.wikipedia.org/wiki/Penedo_da_Saudade>.  Acesso em 23 jan. 2020.

Prefeitura Municipal de Coimbra. Disponível em: <https://www.coimbra.mg.gov.br/>. Acesso em 23 jan. 2020.

Um comentário:

Valéria Aparecida Bari disse...

Querida Natânia, o conhecimento humano é o nosso maior tesouro. Sempre vai conseguir preservar-se na língua, nos registros, nas artes. No entanto, o amor à humanidade tem sido severamente castigado, pela crueldade desse mesmo ser humano. A valorização do ter e a supremacia do possuir têm ferido de morte o ser. Então, quando vejo uma postagem como a sua descrição de viagem à Coimbra, sinto que o ser ainda sobrevive ao ter e ao possuir, e nossa querida humanidade ainda está à salvo.
Abraços e votos de um bom regresso à nossa querida terrinha.