quarta-feira, 13 de novembro de 2019

O PACOTE ( 더 패키지): CONHECENDO A FRANÇA E ENTENDENDO A SOCIEDADE SUL COREANA


O Pacote (Deo Paekiji // 더 패키지), é um dorama coreano (K-drama), de 2017, dirigido por  Jeon Chang-geun e Kim Jin-won e cujo roteiro é de Chun Sung-il (que inclusive faz um ponta na série, como o dono de uma agência de viagem), com doze capítulos.

É uma serie que explora o microcosmos de relações familiares e afetivas de um grupo de turistas que partem para uma viagem de 10 dias à França. A narrativa se constrói a partir da história de  Yoon So So (interpretada pela Lee Yeon Hee), que é uma guia turística coreana que vive sozinha na França, longe da família e que se apaixona por um dos turistas do grupo que está guiando, San Ma Roo (interpretado pelo cantor e ator Jung Yong Hwa). 

É uma história de amor? Sim! Mas que tipo de amor? Do amor entre pai e filha, entre namorados que estão juntos há muitos anos, entre marido e esposa já idosos que enfrentam a possibilidade de embarcar numa vida de solidão. Mas é, acima de tudo, uma série que foge de muitos clichês que caracterizam as comédias românticas sul coreanas. É uma história sensível que explora os dramas do dia a dia de um pequeno grupo de oito pessoas, cada um enfrentando seus próprios desafios. Divertida e, ao mesmo tempo, tocante.

A série é superior a muitas outras do gênero, em muitos aspectos. Uma das coisas que me chamou a atenção foi o cuidado com a fotografia. As locações foram muito bem escolhidas e a edição ficou perfeita (pelo menos eu não encontrei nada que me desagradasse ou chamasse atenção de forma negativa). E a lista de pontos positivos não para aqui. Vamos por partes.

Os atores são muito bons, destaque para os veteranos  Lee Ji Hyun  (como Han Book Ja) e Jeong Gyu Su (como Oh Gab Soo) que dão um show de interpretação. Se na maior parte dos dramas a gente se foca no casal romântico, eu fiquei encantada com o casal de anciãos que dá, ao mesmo tempo, um toque de humor e desperta a empatia.
Lee Ji Hyun e Jeong Gyu Su em uma cena em Paris.

O roteiro é o ponto alto. Sério, durante todos os doze capítulos eu me indagava: que roteiro fantástico! Tanto que a primeira coisa que fiz foi pesquisar justamente o roteirista Chun Sung-il, que descobri é praticamente um veterano da industria cinematográfica coreana, atuando como ator, diretor e roteirista. Até quis saber mais sobre ele, mas não encontrei um site oficial, apenas uma lista dos filmes nos quais atuou, dirigiu e escreveu o roteiro. Tipo da pessoa que eu admiro, que se destaca pelo talento e não (apenas) pela aparência (pelo menos essa é minha impressão, como consumidora do trabalho dele). 

Eu sempre leio resenhas de séries famosas coreanas antes de assistir ou depois que eu assisto, se gostar muito, para comparar impressões. Eles sempre se focam na beleza dos protonistas ou na química entre eles. Mas no caso de "O Pacote", mais do que isso está a beleza da história, em si. 

Um ponto do roteiro que me chamou a atenção á a forma como ele introduz a histórias de cada personagem ao longo da narrativa, com flashs do passado e situações do presente. É interessante como, a partir de certo ponto, o romance dos protagonistas vai dividindo espaço com os dramas pessoais de cada personagem sem que isso oferece o ritmo da narrativa. E não tire conclusões precipitadas: muita coisa não é o que parece. 

Além disso, há ainda uma boa quantidade de referências diretas a clássicos do cinema francês e a muitos pintores, como Van Gogh e alguns impressionistas, dando um tom de erudição ao texto. Do início ao fim, "O Pacote" convida o expectador a conhecer mais sobre a história, a cultura e o patrimônio da França.

 Você já foi à França? Eu já fui, quatro vezes, e juro que tive a sensação de que eu nunca tinha ido. O filme deixa dicas fabulosas de turismo. É uma mistura perfeita de k-drama com documentário. Difícil descrever. Eu poderia montar um roteiro de viagem a partir desta série, sem risco de me arrepender.
Uma das locações da série - Mont Saint Michel (França).
Outra coisa que gostei muito foi do fato da série questionar o tempo todo os tabus sociais da Coréia do Sul, desde a questão à repressão sexual às formas de tratamento entre coreanos. A protagonista, num determinado momento diz que o que mais a assunta na Coréia do Sul são os coreanos, pela sua visão limitada de mundo e sua falta de empatia. 

O irmão de So So, que a reencontra depois de muitos anos, diz aos seus pais que ela se "tornou uma francesa". Uma referência ao fato de que ela não possuí mais a formalidade característica dos orientais.  Em fala-se isso abertamente. Em muitos momentos, critica-se o machismo, como na hora que o senhor idoso diz que viveu como um tolo pois apenas reproduzia os comportamentos que achava que eram corretos e reprimia seus sentimento.

Afinal, é uma comédia romântica? Sim! E há cenas em que o expectador vai rolar de rir. O romance está na dose certa não sendo açucarado demais e, o desfecho, tem tudo a ver com a personalidade da protagonista. 

E aí, quando eu achei que nada mais poderia me impressionar, So So, a guia turística, fala sobre o "dever de memória", um conceito que surgiu na França. Aos pés do arco do triunfo ela explica como os franceses valorizam a memória. Eles não querem se esquecer e por isso valorizam a história. Perfeito, não?

Eu poderia gastar páginas falando dos pormenores da série e de cada um dos personagens, mas não vem ao caso. Até porque isso já foi feito em outras postagens. Mas não posso deixar de elogiar o roteiro, a fotografia e, claro, a direção que, para mim, foram os grandes protagonistas deste K-drama.

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