Para quem viveu a década de 1980, falar
de Guerra Fria era uma coisa quase que rotineira. Os telejornais estavam sempre
noticiando alguma tensão entre Estados Unidos e União Soviética. Nos jornais
impressos não havia como falar de política externa sem falar sobre Guerra
Fria. Para os mais jovens, aquela que foi uma realidade de medo que tomou conta
do mundo de 1947 a 1991, nada mais é do que "história". Aliás, eu
ainda acho estranho quando um aluno me pergunta: o que é a União Soviética. Acho que
é uma reminiscência dos meus tempos de juventude.
Devaneios a parte, chamou-me a atenção,
há algum tempo atrás, a presença de charges sobre a Guerra Fria na Gazeta de
Leopoldina, mais especificamente no ano de 1951. Charges e/ou quadrinhos
naquele periódico eram raros e eu os identifiquei apenas durante curtos
períodos. Charges políticas eram mais raras do que as tirinhas humorísticas.
Toda charge, é uma forma de ataque.
Ela, normalmente, é uma forma de humor que pode possuir conotações políticas. A
charge é crítica, direta e busca obter uma reação impactante do leitor de um
jornal ou revista. Mas nem toda charge é feita (apenas) para se rir. Ela também
é uma forma de denúncia, de alerta, muito utilizada pelo jornalismo ilustrado.
No caso das charges publicadas no ano
de 1951, entre os meses de janeiro e novembro, elas particularmente chamaram
minha atenção, pois remetem à política internacional e, muitas delas, são
carregadas de agressividade incomum e pouco humor. Podemos encontrar uma
explicação para isso no próprio contexto histórico que norteia o ano de 1951.
Naquele ano os Estados Unidos fizerem
uma série de testes que resultariam na primeira bomba de hidrogênio, criada a
partir da fusão nuclear. O sucesso das pesquisas vieram em 1 º de novembro de
1952, quando os Estados Unidos detonaram com sucesso "Mike”, no Atol
Elugelab nas ilhas Marshall do Pacífico, que resultou na vaporização de uma
ilha inteira. A bomba de hidrogênio tinha um poder de destruição muito maior do
que as bombas usadas pelos Estados Unidos no Japão, em 1945. Três
anos depois, a União Soviética domina essa mesma tecnologia.
Paralelamente à corrida armamentista,
entre os anos de 1951 e 1953, temos a
Guerra da Coréia. A China comunista pressiona a Coréia a aderir ao regime
socialista, o que tem como resultado a divisão do país em Coréia do Sul e
Coréia do Norte, que persiste até os dias atuais. O envolvimento dos Estados Unidos
e da União Soviética no conflito é evidente. A Coreia do Sul fica sob influência dos Estados Unidos e adota o capitalismo, a Coréia do Norte sob
influência soviética se torna um país socialista.
Foram anos de tensão,
onde as hostilidades entre o bloco capitalista e o bloco socialista são cada
vez maiores. Essas tensões são evidentes nas charges publicadas pela Gazeta de
Leopoldina.
As charges (todas as onze que eu identifiquei) foram reproduzidas de jornais norte-americanos, possivelmente publicadas em grandes jornais brasileiros e reproduzidas pela Gazeta. Seis delas possuíam traços de humor, mas as demais eram nitidamente agressivas, como veremos nas quatro charges abaixo.
Gazeta de Leopoldina. Leopoldina, 18 de fevereiro de 1951. |
Gazeta de Leopoldina. Leopoldina, 22 de março de 1951. |
Gazeta de Leopoldina. Leopoldina, 06 de maio de 1951. |
Gazeta de Leopoldina. Leopoldina, 29 de julho de 1951. |
Essas charges são uma amostra a intensa propaganda ideológica feita pelos Estados Unidos contra a União Soviética e todos o bloco socialista. Na primeira, os Estados Unidos apresentam-se como o braço armado do mundo capitalista. Na segunda justificam o uso da força contra os comunistas. A terceira representa um desafio ao mundo comunista, na forma de um discurso proclamado pelo presidente Harry Truman ao Congresso norte-americano. Por fim, temos um ataque direto à China comunista.
Vamos perceber que o humor está ausente e que a ideia é impactar pelo medo, é desmoralizar o inimigo. Enfim, as ilustração representam uma expressão da política externa agressiva que caracterizou aquele período, uma resposta ideológica à expansão do mundo socialista, que se tornou ainda mais temida com a Revolução Socialista na China.
Essas imagens podem servir como um excelente material para se trabalhar o tema e fazer um link com a história de Leopoldina, que não estava alheia às transformações e mudanças que o mundo sofria e que participou em micro-escala da guerra ideológica que marcou os anos de Guerra Fria.
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