Carolina de Jesus foi uma poetisa e escritora que se tornou conhecida em vários países, na década de 1960. Em 2017, a editora Veneta publicou uma HQ biográfica que conta a história desta mulher que mesmo morando na favela, nas piores condições, e sem acesso à educação formal, criou uma obra ímpar, na qual desnuda a realidade brasileira com uma sensibilidade excepcional. Não por acaso, a HQ, traduzida para o francês recebeu em 2019 o Prêmio Ecumênico no Festival Internacional de Quadrinhos de Angoulême, na França, considerado um dos maiores e mais importantes do mundo.
A poetisa da favela, como era chamada, representa não apenas para
a literatura brasileira, mas, também, para a História Social e das Mulheres no
Brasil. A vida de Carolina é, acima de tudo, um testemunho da realidade
brasileira das décadas de 1960 e 1970 como, também, o raio-x de uma sociedade
marcada pelo preconceito e pela discriminação. E Carolina de Jesus entendeu bem
isso: era pobre, favelada, mulher, mão solteira e negra.
Os autores desta HQ, a pesquisadora Sirlene
Barbosa e quadrinista João Pinheiro, fizeram um trabalho excelente, tanto na
coleta do material, quando na forma como contaram, com muita sensibilidade, a
história de Carolina, tendo como referêcias seu livro mais famoso, “Quarto de
despejo”, e outras obras da autora, como “Casa de Alvenaria”, “Pedaços
da fome” e “Diários de Bitita”.
A HQ coloca em suas páginas, passagens da vida de Carolina. A
Carolina menina, no interior de Minas Gerais, a Carolina moradora da favela, na
sua luta diária pela sobrevivência, a Carolina mãe, carinhosa, protetora e
focada em garantir um futuro para os filhos. Um mergulho na realidade muitas
vezes romantizada da vida nas grandes favelas, apresentando para o grande
público os efeitos da miséria e da desumanização.
De outro lado, uma lição de vida que mostra que a leitura, a
cultura e a busca pelo aprendizado podem ser libertadores, Carolina de
libertava através da escrita. Os livros que encontrava no lixo eram seus
companheiros nas noites solitárias. Com o ensino fundamental incompleto, ela se
tornou leitora de Camões e de outros autores clássicos da literatura mundial e
nacional.
Uma mulher erudita que se construiu em meio à miséria das favelas
paulistas da década de 1960. Uma
feminista, à sua maneira, que não dependia dos homens para trilhar seu caminho,
que criou os filhos em meio a muitas dificuldades e que nunca baixou a cabeça
por ser mulher, pobre e negra.
Para finalizar eu, claro, recomendo a leitura da HQ Carolina, como
uma forma de se introduzir no mundo desta escritora que trouxe de forma tão realística para os livros a vida da gente comum brasileira num período em que buscava
fazer o encobrimento das mazelas da nossa sociedade. Numa época em que se
propagava o desenvolvimento econômico, mas se ocultava a fome e a miséria.
A obra de Carolina mostra o Brasil que as pessoas não querem ver,
mas que é necessário conhecer. O Brasil da pobreza, da fome, do preconceito de
classe e do racismo. Enxergar este Brasil é um passo importante para superá-lo,
para que possamos operar uma mudança significativa para o futuro. Este talvez
seja o maior legado de Carolina de Jesus.
Um comentário:
Muito obrigada pela resenha e pelo cuidado para falar da escritora Carolina Maria de Jesus! Gratidão por ela e pelo respeito ao nosso trabalho!
Sirlene Barbosa
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