domingo, 22 de maio de 2022

ARTIGO FALANDO SOBRE WEBTOONS E K-DRAMAS PUBLICADO EM REVISTA DA UFS

 


Faz um tempo que eu escrevi um artigo sobre cultura pop coreana - especificamente dramas e quadrinhos. Ele foi publicado recentemente pela Revista Cajueiro, pela UFS. É um texto bem didático e pelo qual eu tenho muito carinho e fiquei muito feliz em vê-lo disponível, inclusive com uma versão em inglês. Segue o resumo do texto. Quem gostar do resumo, pode ter acesso ao artigo, clicando aqui!

De Webtoons a K-dramas as adaptações de manhwas e as tendências lançadas pela Korean Wave

Resumo: Dentro da Korean Wave, os manhwas são um dos produtos culturais que estão sendo levados para outros países, algumas vezes confundidos com os mangás japoneses. São narrativas sequenciais gráficas, com linguagem híbrida de texto e imagem, com diferenças verificáveis nas metáforas visuais e enredos. A Korean Wave é um fenômeno Cultural do séc. XXI, que se encaixa dentro de um quadro geral da globalização, no qual artefatos culturais assumiram um papel importante tanto para a economia quanto para a sociedade de dado país ou região. Esse artigo apresenta aspectos da Korean Wave ou Hallyu (onda coreana), que pode ser resumido na expansão de múltiplos aspectos da cultura sul-coreana para as mais diversas regiões do mundo. Apresentam-se como fonte de leitura e entretenimento, sobretudo infanto-juvenil, devido ao seu acesso facilitado, por meio dos smartphones, assim como os temas atualizados e de interesse para a juventude, em nível global. Conclui que o fenômeno da leitura sofre profundas alterações, e requer estudos no campo cultural, particularmente aqueles que optam pela interdisciplinaridade, necessários para absorver as mudanças que vêm sendo operadas tanto nas relações humanas quanto na produção de conhecimento.

 

A REVISTA CAJUEIRO  é editada pelo GRUPO PLENA: Grupo de Pesquisa em Leitura, Escrita e Narrativa, em formato eletrônico. É publicada pelo Sistema Eletrônico de Editoração de Revistas da Universidade Federal de Sergipe. Se trata de um periódico científico semestral, que tem como objetivo principal promover a difusão, democratização e fortalecimento das pesquisas em Ciência da Informação, com ênfase na contemplação dos objetos e objetivos referentes à formação de leitores e da cultura da leitura, em todos os seus aspectos e ambientes sociais, assim como observar as repercussões positivas dos hábitos e gostos leitores na sociedade. Visa também ampliar o diálogo com a comunidade científica internacional e contribuir para o desenvolvimento da sociedade, nos caminhos da leitura.


domingo, 15 de maio de 2022

TRABALHAR II GUERRA MUNDIAL E ESCRAVIDÃO SEXUAL DE MULHERES USANDO SÉRIE DE TV

Estátuas memoriais, espalhadas por várias partes da Coreia do Sul, criadas para chamar atenção do governo e protestar contra o Japão. 

Um dos mais abomináveis crimes cometidos pelo Japão durante a II Guerra Mundial foi a escravidão e exploração sexual de mulheres em instalações criadas pelos japoneses, para servirem com bordeis para seus soldados. Esse sistema de exploração sexual baseado na criação de “estações ou casas de conforto” vitimou centenas de milhares de mulheres que ainda aguardam a reparação pelos danos físicos e psicológicos deixados pela experiência.

Foram criadas cerca de 400 “estações de conforto”, espalhadas pela China, Filipinas, Taiwan, Cingapura, Indonésia, Birmânia, Tailândia e Vietnã, sempre próximas às bases militares. Estima-se que cerca de 80 a 200 mil mulheres foram forçadas a prestar serviços sexuais a soldados japoneses durante a Segunda Guerra Mundial, sendo que apenas 30% delas sobreviveram. O maior número de mulheres era de origem coreana, cerca de 80% delas.

NHD Boulder Valley “Truth Be Told” por Eliana White

Esse horrendo crime de guerra permaneceu por décadas esquecido/omitido, uma vez que as vitimas, intimidadas pela sociedade, e por suas próprias famílias, permaneceram caladas. Só recentemente o tema emergiu graças ao depoimento de uma das vítimas, já idosa, assombrada pela dor das memórias de guerra e em busca de justiça. Qual justiça? O reconhecimento do crime e um pedido oficial de desculpas do Japão, que até hoje não aconteceu.

Eu conheci o tema por meio de uma HQ produzida pela sul-coereana Keum Suk Gendry-Kim, em 2017, e traduzida para diversos idiomas, como inglês e francês, e publicada no Brasil, em português, em 2020. O quadrinho , de nome “Grama”, baseia-se no depoimento de uma sobrevivente e em pesquisas realizadas pela autora (clique aqui se quiser saber mais). Para quem não sabe, a península da Coreia foi invadida e colonizada por japoneses no início do século XX e seu povo sujeito às mais diversas agruras.

O tema se tornou um dos meus favoritos, em termos de historiografia, e me fez interessar pela história de países do leste asiático, que pouco ou quase nada estudamos no Brasil, dada a nossa tradição eurocêntrica.  Por isso foi uma grata surpresa poder assistir um episódio, o de número 13, de Tomorrow (Amanhã), série do Netflix, abordado esse tema. 

Normalmente, eu me contento e comentar os aspectos gerais de uma série/drama, mas neste caso, chamo aqui a atenção para um capítulo específico. Isso porque no episódio 13, retirando a parte fantasiosa da série, temos uma reconstituição histórica da exploração dessas mulheres durante a II Guerra. A reconstituição baseia-se no relato de uma personagem fictícia, uma sobrevivente, idosa, que nos últimos momentos de sua vida ainda espera por reparação. A sobrevivente Jeong-mun, conta sua história e a de outras mulheres, e faz uma apelo à memória: não esqueçam. 

Cena de Tomorrow, episódio 13, mostrando as meninas sendo levadas para as estações de conforto por soldados japoneses.


Eu, particularmente, achei esse episódio precioso. Não apenas pelo tema que aborda mas, também, pela forma que o tema foi abordado. Com certeza eu irei utilizá-lo em sala de aula, uma vez que ele ilustra de forma clara e didática tanto a tragédia das Comfort Women como, também, a própria questão da memória e questões relacionadas a gênero. Além disso, proporciona apresentar aos alunos uma outra abordagem sobre a II Guerra, que vai para além dos conflitos ocorridos na Europa e da questão do próprio holocausto.

Eu, particularmente, pretendo introduzir o tema das Comfort Women quando for estudar II Guerra Mundial e usar esse episódio do Netflix como material de apoio. Em seguida pretendo trabalhar as noções de crime de guerra e falar sobre a escravidão sexual. Como forma de avaliação vou pedir para que façam uma história em quadrinhos sobre o tema, e aí vou usar Grama como exemplo e, também, material de apoio.

Esse episódio será exibido no Brasil no dia 21 de maio, no Netflix. Recomento para uso de professores de história e mesmo de outros conteúdos. Mesmo sendo um episódio de uma série que envolve um contexto maior, é possível usar essa parte do programa para fins didáticos sem problemas. Claro, recomendo ao professor/professora, fazer uma breve pesquisa sobre o assunto para poder melhor aproveitar esse material e enriquecer a aula.

quinta-feira, 12 de maio de 2022

ANNE MERGEN E AS CHARGES POLÍTICAS NA DÉCADA DE 1940

Anne Mergen foi uma pioneira nas artes gráficas que atuou como cartunista e chargista, entre as décadas de 1930 e 1950. Anne Briardy Mergen nasceu em Omaha, Nebraska, em 9 de agosto de 1906. Já na infância, a jovem Anne já se interessava pelo desenho, interesse esse que a levou a cursar arte comercial em comercial em Chicago. Foi lá que a autora começou a desenvolver o estilo que marcaria a sua obra e a tornaria mais tarde a primeira dama da charge política nos Estados Unidos, onde desenvolveu seu próprio estilo distinto. Ela se mudou para Miami em meados da década de 1920, onde começou a trabalhar em publicidade de moda para uma loja de departamentos local.

Começou a carreira como cartunista editorial no Miami Daily News, jornal no qual trabalhou por décadas.  Ela trabalho como artista de publicidade de moda para uma loja de departamentos, época em que começou a enviar seus desenhos para o Começou no produzindo desenhos de moda para o jornal Miami Daily New e, em 1933, publicou seu primeiro cartum editorial.  Usando sua formação na escola de arte, experiência em ilustração de moda e seu conhecimento sobre política, fruto do interesse que ela tinha sobre o tema, Mergen se formou e em 1936 e passou a trabalhar em integral como uma cartunista editorial, tornando-a a única caricaturista política nos Estados Unidos. Mergen foi uma das primeiras mulheres a atuar no jornalismo político ilustrado, área na qual, até então, era domínio dos homens.

The Master of Jet Propulsion. Publicado em 15 de february de1940. Anne Mergen Collection, The Ohio State University Billy Ireland Cartoon Library & Museum.

Mergen dividiu o trabalho com o cuidado com a casa, como muitas mulheres de seu tempo. Ela produziu sua obra principalmente em um estúdio caseiro, dividindo o trabalho jornalístico com os afazeres domésticos e a criação dos filhos. Em seu trabalho, cobria tanto manchetes nacionais quanto internacionais, o que dava à sua produção um caráter mais amplo, assim como exigia de Mergen um conhecimento maior tanto do contexto local quando global.

Como cartunista, Anne Mergen, se interessava por temas sobre política internacional. Produziu muitas charges sobre a  II Guerra Mundial e após a guerra, ela continuou a comentar sobre as questões sociais e políticas como a energia atômica, a corrida armamentista, a Guerra da Coréia. Apesar do destaque para a produção voltada para a política internacional, uma característica da produção de Mergen era a preocupação com questões “domesticas”, temas que diziam respeito ao bem estar social da população estadunidense. Dentre elas temos questões relacionadas à saúde e a educação.

 

 A direita:Running a poor second, 02 de outubro de 1955/ A esquerda: The message from above, 01 de junho de 1954. Fonte: Library of Congress.

Quando a Suprema Corte dos EUA decidiu que a segregação racial nas escolas públicas era inconstitucional, ela apoiou e de enfaticamente decisão, tendo produzido a charge “The Message from Above”. Além disso, foi defensora ferrenha de melhorias na educação, com escolas melhor equipadas e preparadas para receber a população, independentemente da cor ou da origem social. Mergen também fez campanha pela vacina contra a poliomielite, que considerava um risco às crianças, população mais vulnerável à doença. Esse último tema, em particular lhe era muito caro, tanto que que a autora chegou a comemorar o início do uso da vacina, em 1955, segundo depoimento da sua filha, Joan Bernhardt.  

Apple For Teacher, 23 de maio de 1954

Anne Mergen se aposentou em 1956, mas continuou produzindo até 1959. O trabalho de Mergen durou mais de 20 anos, período durante o qual a cartunista produziu mais de 7.000 lustrações. Em 2013, sua obra pode ser vista no  The Florida Historic Capitol Museum , em uma exposição que durou de 12 de março de 2013  a 21 de julho de 2013, intitulada “Anne Mergen: Florida Cartoons - Trace the Power of the Editorial Cartoon”. Parte de obra pode ser acessada encontrado no site da The Ohio State University, no setor Digital Collections. A cartunista faleceu em 3 de julho de 1994.

É necessário finalizar dizendo que Anne Mergen foi uma mulher que de muitas formas desafiou os padrões de sua época. Não apenas por atuar numa área dominada pelos homens, mas pela sua militância social e pela consciência que tinha sobre a força do seu trabalho. Foi uma mulher que não se sentia intimidada pelo machismo presente na sociedade estadunidense e que foi maximizado após a II Guerra Mundial. Mergen desafiou paradigmas, destacando-se tanto na análise de problemas políticos e sociais como no uso inteligente do humor como forma de criticá-los.

Fontes:

Anne Briardy Mergen, 1906-1994. Wander Women Project. Disponível em: <https://wanderwomenproject.com/women/anne-briardy-mergen/>. Acesso em 11 mai. 2022.

Anne Mergen. Women in Comics. Disponível em: < https://womenincomics.fandom.com/wiki/Anne_Mergen>. Acesso em 11 mai.2022.

Megen, Anne. Political Cartoons and massive resistance in Virginia. Disponível em: < http://www.littlejohnexplorers.com/jeff/brown/cartoon/cartoonfullpage22.htm>. Acesso em 11 mai. 2022.

NATANSON, Barbara Orbach (2020).  Ready for Research: Anne Mergen’s Editorial Cartoons. Disponível em: < https://blogs.loc.gov/picturethis/2020/02/ready-for-research-anne-mergens-editorial-cartoons/>. Acesso em 08 mai. 2022.

SPITZER, Tanja B.  Anne Mergen: First Lady of Editorial Cartoons During World War II (2020). Disponível em: <https://www.nationalww2museum.org/war/articles/anne-mergen-political-cartoons>. Acesso em 08 mai. 2022.

domingo, 8 de maio de 2022

COMENTANDO O SOM DA MAGIA (안나라수마나라 )


Faz um tempo que um programa de televisão me desperta o desejo de escrever. Sendo assim, não posso menosprezar essa inspiração repentina e vou tentar traçar aqui em poucas linhas as minhas impressões do novo k-drama da Netflix, "O Som da Magia" (안나라수마나라 ). Reconheço que assisti o programa por curiosidade, uma vez que ele traz a proposta de explorar o gênero musical. 

Embora a música esteja presente em boa parte das produções sul-coreanas, uma produção que se apresenta como um drama musical não deixa de ser inusitada. Além disse, trata-se de uma adaptação de um webtoon, uma história em quadrinhos para leitura em celular. Os webtoons sul-coreanos têm crescido no gosto do público global e fornecido material para diversas produções como, por exemplo, "O Rei de Porcelana", k-drama lançado pela Netflix, final do ano passado, e que foi um grande sucesso. 

Poderia citar mais uma dezena dessas adaptações, nos mais diversos gêneros, como fantasia, terror e aventura. No caso de "O Som da Magia", a adaptação não apenas foi muito feliz como ultrapassou qualquer expectativa que e tivesse anteriormente. 

Para começar, a escolha do elenco foi muito boa. Os protagonistas, os antagonistas e o elenco de apoio foram excelentes. E olhem que não sou muito fã de Ji Chang-wook mas acho que o ator se desafiou, fugindo um pouco dos papéis de ação e das comédias românticas que lhe são característicos. Além disso, ele canta e dança muito bem, pelo menos o suficiente para cumprir satisfatoriamente seu papel na série. 

A trilha sonora e as coreografias também foram um destaque, afinal, é um musical. As Melodias são muito bonitas, arranjos musicais de qualidade e cantores competentes. Foi o primeiro musical sul-coreano que eu assisti e não deixa a desejar aos musicais da Disney, por exemplo. Mas se a música e a dança são a marca registrada do programa, ele não se reduz a isso. Na verdade, essa série mergulha num tema muito profundo, que é a passagem da adolescência para a vida adulta e as escolhas que os jovens têm que fazer.

No caso da Coreia do Sul isso envolve uma série de fatores que não nos são tão comuns. Por exemplo, cobra-se a excelência dos jovens. Essa cobrança retira deles parte da juventude, estimula comportamentos como o bullying e mesmo o suicídio. A pobreza, a pressão da família, o ambiente por vezes hostil da escola, as cobranças duras da vida. Tudo isso e um pouco mais serve de pano de fundo para uma história que aquece o coração.

Na trama temos um mágico Lee Eul, interpretado por Ji Chang-wook, que vive em um parque de diversões abandonado. Ele entra na vida de dois estudantes do ensino médio, Yoon Ah-yi (Joo Ye-rim) e Na Il-deung (Hwang In-youp). Os três compartilham histórias pessoais repletas de dor e tristeza e aprendem juntos a superar suas dificuldades.

É uma história que traz uma crítica social muito forte, na qual questiona-se a interferência da família nas escolhas dos filhos e a forma como isso pode levar ao desenvolvimento de distúrbios psicológicos e mesmo alienação social. Aliás, uma das partes que eu mais gostei foi justamente quando o jovem Na Il-deung percebe que aqueles que são incompreendidos pelas suas escolhas, classificados como loucos ou alienados, são justamente aqueles que desafiaram os paradigmas sociais e buscaram outros caminhos.

Uma história muito bonita, bem construída e com o uma carga, psicológica, sociológica e filosófica muito grande.  Esse k-drama tem apenas seis episódios, mas que poderia ter mais, sem dúvida, sem perder a qualidade. Recomendo a quem quer assistir algo diferente.