Os periódicos podem ser utilizados como objeto e fonte de
pesquisa para a História. Eu, particularmente, utilizo periódicos desde que
comecei a pesquisar História Regional, em 1994. Eles se tornaram uma fonte que
eu aprecio e valorizo muito e um recurso inestimável, tanto no que diz respeito
ao estudo da História Local, quanto de outros campos da história.
Nesta
postagem eu pretendo falar um pouco sobre esta experiência e tentar dar algumas
sugestões para quem tem interesse em estudar história regional, mas encontra dificuldades em conseguir acesso a fontes.
Mas
o que são exatamente os periódicos?
As
publicações periódicas são
aquelas publicadas em intervalos de tempo regulares, que podem abordar um
assunto específico ou vários assuntos. Elas podem ser publicadas em papel ou em
meio digital. Sua periodicidade pode variar. Eles podem ser semanais,
quinzenais, mensais, semestrais, anuais, etc. O número de publicações vai
variar de caso para caso. Podemos citar como publicações periódicas os jornais,
as revista informativas, revistas científicas e as revistas em quadrinhos.
Os periódicos podem ser utilizados como
fontes de pesquisa não apenas para a História, mas para outras disciplinas. Mas
seu uso deve ser realizado a partir de critérios bem definidos. É preciso ter
em mente que cada estudo deve partir de uma hipótese, que para confirmar esta
hipótese devem ser estabelecidos objetivos e questões precisão ser respondidas.
É preciso criar uma base metodológica para que o resultado do estudo possa
contribuir de alguma forma para a construção do conhecimento legítimo.
Não podemos nos limitar a utilizar apenas uma fonte de pesquisa. Isso porque toda fonte possuí alguma
limitação. Por isso é aconselhável e
necessário que as fontes documentais sejam respaldadas por uma boa bibliografia e uma teoria que
permitam construir os alicerces da pesquisa.
Há
algum tempo atrás os jornais e as revistas populares tinham sua importância
como fonte questionada, uma vez que geralmente seguiam as tendências ideologias
e políticas de quem as produzia. Ou seja, tinham um discurso que partia de um
ponto de vista em particular. Atualmente, considera-se que a análise do
discurso é uma das formas de se entender como, por exemplo, os diversos
segmentos sociais se posicionavam em dado contexto histórico.
Ou
seja, o jornal ou a revista se tornaram fontes importantes justamente por sua subjetividade, por trazerem as representações da realidade de pontos de vista
particulares. Assim, tudo aquilo que a humanidade
produziu, a sua cultura material, é fonte para estudos variados. Algumas fontes
podem trazer para o pesquisador muitas informações relevantes acerca de
determinado tema. Outras, mais do que informações, trazem problemas,
questionamento.
Qual delas em minha opinião é a melhor?
- Aquela que me faz questionar e buscar soluções para os
problemas que ela me propõe.
Desta forma, se os periódicos estão carregados de discursos
e representam o ponto de vista de determinados grupos. Ele estimula o
pesquisador a buscar outros pontos de vista, a identificar representações, a
buscar a melhor teoria para embasar suas hipóteses. Além disso, o
periódico, muitas vezes, é a única fonte disponível para o historiador,
notadamente aquele que se dedica a pesquisas em história local, uma vez que muitos
pequenos municípios não possuem arquivos organizados e a documentação oficial,
quando existe, nem sempre está disponível para pesquisa.
Assim,
para quem deseja pesquisar história local, os jornais são uma ótima fonte de
pesquisa. A princípio porque normalmente pode-se obter mais de um título de
jornal e, desta forma, ter acesso a mais de um tipo de informação e/ou discurso.
Por exemplo, eu hipoteticamente quero
entender o impacto da lei áurea na minha cidade. Tenho disponível um jornal de
1888, publicado por um grupo de advogados abolicionistas.
No
entanto, me interessa analisar não apenas um ponto de vista. Para isso, posso recorrer a outro periódico, do mesmo período, que
represente o ponto de vista daqueles que se consideravam lesados pela lei da abolição. Caso não exista, nos arquivos que eu tenho disponíveis para consulta este
material, uma alternativa é buscar nos jornais de cidades vizinhas informações
sobre o assunto. Levantados estes dados,
posso fazer um cruzamento com fontes bibliográficas sobre abolição da escravidão
e, então, terei material para compor uma parte da história local ou regional
partindo do micro para o macro.
As
pesquisas realizadas a partir dos jornais criam ainda a possibilidade de se
escrever uma história do cotidiano, A história das pessoas comuns e dos
obstáculos e mesmo alegrias do seu dia a dia. Este tipo de história é
importante para a criação de uma identidade coletiva regional e reforça o sentimento
de pertencimento de quem vive numa dada localidade.
Por
exemplo, determinada matéria do jornal fala sobre os problemas ocasionados
pelas chuvas em meados o século XIX. A partir desta matéria podemos encontrar
dados que ajudem a entender mais sobre a questão urbana e os desafios
enfrentados pela população. Estes dados podem ser cruzados, por exemplo, com as
posturas municipais vigentes no
período.
Posturas
municipais são as leis criadas para regulamentar a vida nos municípios. Do
saneamento, construções, funcionamento dos cemitérios e até circulação de
pessoas, as posturas estabelecem o que é permitido ou não em um município como
forma de manter a ordem local. No caso de Minas Gerais estas leis, as mais
antigas, podem se encontradas digitalizadas para consulta ou mesmo download no
site do CEDPLAR – UFMG,
que possuí uma coleção das leis de Minas Gerais de 1842 a 1888. Os sites das
prefeituras também costumam disponibilizar suas posturas que estão em vigor.
Outra
fonte para pesquisa que pode ajudar muito quem quer estudar história local por
meio de jornais são as hemerotecas.
Hemerotecas são coleções de periódicos, que fazem parte de arquivos,
bibliotecas ou centros de documentação.
Foram criadas para guarda e conservação desta documentação e, também, para
garantir acesso à informação. Atualmente temos a possibilidade de utilizar as
hemerotecas digitais, o que permite, por exemplo, que uma pessoa que more numa
cidade do interior tenha acesso aos centros de documentação de grandes capitais
brasileiras ou mesmo estrangeiras.
Uma
das maiores hemerotecas que temos no Brasil é a Hemeroteca Digital da
Biblioteca Nacional, que possui uma coleção enorme de periódicos,
inclusive de cidades do interior do Brasil. Nem todas as coleções estão
completas, mas os bancos de dados estão constantemente sendo atualizados com
novos títulos. Além disso, o sistema de busca permite que o pesquisador
encontre em jornais de outras cidades ou mesmo estados, matérias referentes à
sua cidade ou mesmo de personalidades que nela viveram.
Além
disso, demos ainda a bibliografia referente à história local que pode e deve
ser usada para dar maior embasamento à pesquisa. Desta bibliografia faz parte
livros e revistas que trazem a história da cidade ou município, assim como
biografias e memórias. Este material geralmente pode ser encontrado nas
bibliotecas municipais.
Outro
recurso são textos publicados em revistas científicas ou em anais de
congressos, geralmente disponíveis na internet. Uma ferramenta que permite ter
acesso a este material, a partir de palavras-chave é o “Google Acadêmico” ou “Google Scholar”, uma ferramenta de
pesquisa do Google que permite pesquisar em trabalhos acadêmicos, literatura
escolar, jornais de universidades e artigos variados. Além disso, há uma quantidade enorme de sites que disponibilizam livros digitalizados de autores renomados em formato pdf.
Desta
forma, sem nem mesmo sair de casa, temos como trabalhar com bancos de dados de
jornais, utilizar documentos oficiais (legislações) para complementar ou cruzar
dados, nos apoiar em material bibliográfico sobre a história geral e regional
e, a partir daí, produzir um bom material historiográfico que pode enriquecer
tanto o ensino de história quanto a própria memória regional.
SUGESTÃO
DE BIBLIOGRAFIA
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Um comentário:
Querida Natânia:
Realmente, os artigos de periódicos se prestam à prática pedagógica em geral. Quando eu ministrava disciplinas de Educomunicação para a Pedagogia e o Normal Superior, inclusive explorávamos os grandes recursos que se encontravam nos anúncios classificados (problemas de matemática fantásticos); a familiarização com a leitura imagética (utilizando as fotos como fonte de informação); a narrativa sequencial gráfica (charges, tiras, infográficos); e até a padronização dos textos, em tamanho, linguagem, objetivos narrativos. Mas, eu estava na época do jornalismo impresso. Temos as diferenças marcantes da atualidade,após a convergência das mídias para os suportes digitais. Esses preciosismos podem ser ainda melhor explorados, já que as questões de acesso não são mais pautadas pela capacidade econômica, mas sim pela capacidade comunicacional e a acessividade.
Um abraço!
Valéria Aparecida Bari
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