Acho que estou ficando velha.
Velha no sentido de estar sendo implicante, porque cronologicamente eu já não
posso mesmo ser considerada uma mocinha.
Mas sério, eu tenho me sentindo incomodada
com muitas coisas de um tempo para cá. Hoje, por exemplo, durante o desfile da
Independência eu senti novamente aquele incômodo. Eu tive a sensação de que os poucos alunos presentes,
dos quase oitocentos da escola pública onde eu leciono, não faziam a ideia do que
estavam fazendo no centro da cidade, uniformizados em um domingo ensolarado.
Vou ser mais clara. Todos sabiam
que hoje, sete de setembro, se comemora o dia da Independência do Brasil, mas o
que aparentemente eles não sabiam é o que isso significa ou deveria significar
para cada um deles. E não sabem porque são alunos de periferia e com baixa
renda em sua maioria, mas porque atualmente não se trabalha mais isso. Sei disso
porque recentemente fui questionada por alunos de uma outra escola, de classe
média, onde leciono "por que eles tinham que comparecer ao momento cívico da
escola". Eles não sabiam.
E a gente percebe essa “falta de
noção” dos jovens quando a escola os reúne para os momentos cívicos. Se um
aluno em cem estiver cantando o hino nacional com entusiasmo o diretor da
escola pode comemorar. Geralmente a música toca e se faz silêncio (ou pelo
menos se espera que faça). A bandeira é hasteada, alguma palavras são ditas,
mas não há significado. Não se vê no
semblante dos alunos aquele orgulho, aquele respeito e entusiasmo que deveriam
ser característicos de um momento cívico. E isso está me incomodando.
Assista a um jogo da seleção
brasileira e você verá 50 mil pessoas se acabando ao cantar o hino nacional. É
só nesses momentos que somos brasileiros?
Não sei se o que eu vou dizer faz
algum sentido, mas eu tenho relacionado essa falta de civismo com uma crescente
apatia com relação a normas, leis, direitos e deveres que regulam as relações
entre as pessoas. Outro dia ouvi uma aluna dizendo na sala de aula “Se o
professor me mandar copiar a matéria atrasada eu saio da escola”. “Não aceito
que me mandem fazer nada!”. Pois é, foi uma menina de 13 anos que disse isso e
seus colegas concordaram. Uma coisa completamente sem noção.
Os jovens parecem entender hoje
que TUDO é permitido e que qualquer cobrança é punitiva. Ouço muito falar de
perda de valores, em abandono da família (No sentido dos pais não passarem para os
filhos as regras básicas de respeito ao outro, ao patrimônio a normas de
convivência social. Aquela educação que a gente sempre diz que vem de casa). Veja bem, um jovem de 15 anos acha que é normal ir
desfilar de boné e fone de ouvido. Outro acha que se tem alguém que é pago para
limpar as ruas e os prédios públicos que ele pode jogar o lixo no chão. Uma
moça acha que pode ser grosseira com uma pessoa mais velha porque ela só deve
respeito ao pai a mãe.
Esses são uns exemplos que eu
tenho visto e que têm me incomodado. Sei que entender esse comportamento requer uma
longa e profunda análise psicossocial que eu realmente não tenho capacidade de
fazer. Mas sei que nada disso é novo. Eu falo aqui de adolescentes, mas a falta
de limites está entre os adultos, também. Basta ligar a televisão nesses
programas policiais que a gente encontra casos arrepiantes envolvendo pessoas
com mais de 35 anos de idade. O comportamento de muitas figuras públicas também
está longe de ser exemplar.
Isso me incomoda e me assusta.
Assusta porque atualmente uma pessoa fala “vou matar você” com a mesma naturalidade que
se diz “vou pegar um ônibus.” E com a mesma facilidade que se pega o ônibus no
ponto se mata uma pessoa hoje.
E o que isso tem a ver com o Sete
de setembro e os momentos cívicos?
O desenvolvimento do sentimento
cívico, de pertencimento à nação, de cumprimento do dever, longe de ser ufanista,
é formador de caráter. E isso está fazendo falta. Se não há uma relação direta
pelo menos indireta existe entre uma coisa e outra.
Temos uma lei que determina a obrigatoriedade
de execução semanal do Hino Nacional nos estabelecimentos de ensino fundamental.
É o tal momento cívico. No entanto, ele não dever ser apenas mais uma norma a
ser cumprida. O momento cívico deve estar na sala de aula, onde o professor
deve tirar um pouquinho do tempo para trabalhar certas noções, como as de
pertencimento, participação, engajamento, solidariedade e civismo, independentemente
do conteúdo com o qual leciona. É preciso dar sentido e significado às coisas,
pois a vida para ser bem vivida precisa disso.
Acho que estou ficando velha, mas
acho também que “coisas velhas” podem ser boas. A gente tem a mania de achar que
práticas e tradições antigas estão desgastadas e desatualizadas. Podem até
estar, mas algumas coisas precisam permanecer, para que a sociedade não entre
em conflito consigo mesma, para que possa alcançar uma certa estabilidade no convívio social.
Veja a Lei no 12.03, de
21 de setembro de 2009, que estabelece os momentos cívicos nas escolas.
Presidência da República
Casa Civil Subchefia para Assuntos Jurídicos |
Altera
a Lei no 5.700, de 1o de setembro de
1971, para determinar a obrigatoriedade de execução semanal do Hino Nacional
nos estabelecimentos de ensino fundamental.
|
O VICE –
PRESIDENTE DA REPÚBLICA, no exercício do cargo de PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o
Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:
Art. 1o .
O art. 39 da Lei no
5.700, de 1o de setembro de 1971, passa a vigorar acrescido
do seguinte parágrafo único:
“Art.
39. ………………………………………………..
Parágrafo único: Nos estabelecimentos
públicos e privados de ensino fundamental, é obrigatória a execução do Hino
Nacional uma vez por semana.” (NR)
Art. 2o
Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.
Brasília,
21 de setembro de 2009; 188o da Independência e 121o
da República.
JOSÉ
ALENCAR GOMES DA SILVA
Fernando Haddad
Fernando Haddad
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