quinta-feira, 22 de janeiro de 2009

Especialistas vêem ensino de história mais crítico, mas ainda há falhas

Artigo publicado no Jornal do Brasil, 19 de janeiro de 2009. Foi enviado pelo colegal Júlio Calasans Maia e eu achei legal postá-lo aqui.

Fernanda Thurler - JORNAL DO BRASIL

A força aérea de Israel preparou uma operação de surpresa, os aviões inflectiram para o sul para atacar, simultaneamente, alvos árabes. Por terra, 235 mil militares armados preparam-se para a ofensiva. O cenário de guerra é o mesmo de hoje, a Faixa de Gaza, os envolvidos também, mas aconteceu em 1967, na famosa Guerra dos Seis Dias. Este é um fato relatado em todos os livros didáticos e ensinado aos alunos como um acontecimento referente a um passado acabado, sem uma correlação com o presente. Mas esta metodologia não é aprovada pelos historiadores consultados pelo Jornal do Brasil. Para a professora Ana Maria Mauad, doutora em História Social pela Universidade Federal Fluminense (UFF), os educadores devem mostrar aos alunos, por exemplo, que o conflito deflagrado há 40 anos explica a guerra e as mortes de hoje.

- O presente devia buscar explicações no passado, mas os professores ensinam o conteúdo como simples quadros de desenvolvimento da humanidade sem relação com a atualidade - analisa Ana Maria. - A Orientação do Ministério da Cultura é de evitar o anacronismo e a naturalização dos conceitos.

A historiadora, que foi coordenadora adjunta da avaliação dos livros didáticos pelo MEC, explica que no primeiro segmento do ensino fundamental (1º ao 5º ano) a história é estudada junto com a geografia, na disciplina de estudos sociais. Quando os alunos passam para o segundo segmento (6º ao 9º ano), há ruptura total entre história e geografia. Esta metodologia segmentada, segundo Ana Maria, é reforçada durante os três anos do ensino médio:

- O vestibular engessa o ensino. As provas das universidades não estimulam o pensamento crítico do aluno, apenas a narração dos fatos. Na minha opinião é algo que tem de ser repensado. Este ensino enciclopédico dos fatos não desperta o interesse nos alunos. A escola deve ser criativa para produzir um conhecimento em que o aluno se sinta agente da história.

Livros didáticos

Sobre os livros didáticos, os mais antigos, segundo o historiador Antônio José Barbosa de Oliveira, eram mais factuais, preocupados em contar a história dos fatos, as datas, os personagens.

- Era como um receituário para o aluno poder decorar - compara o professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). - Hoje, os livros de história estão mais contextualizados. Isso não significa que não sejam importantes nomes e datas, é fundamental ter a clareza dos acontecimentos e da cronologia para mostrar que a gente faz parte de um processo de continuidade e de rupturas. Mas há que se que buscar associações. Ao falar da quebra da bolsa de valores de Nova York, em 1929, o professor pode comprar com o que acontecia no Brasil no mesmo período, era o fim da República Velha e da política de exportação de produtos agrícolas.

Oliveira destaca que não tem como fugir muito das aulas expositivas, mas que a tecnologia pode ser um importante instrumento para atrair o aluno.

- Os filmes ajudam bastante, mas para gostar de história é imprescindível o prazer pela leitura - ressalta. - Todos os demais recursos são complementares.

Apesar de segmentado, segundo o pedagogo e autor de livros sobre educação, Hamilton Werneck, o ensino de história está mais crítico. Ele explica que os livros didáticos antigos retratavam o fato sob a ótica portuguesa. Já os mais recentes passaram a reconhecer a colônia, o país subdesenvolvido também como fazedor da história. Além disso, para Werneck, o que direciona os professores de hoje é a corrente francesa Les Annales, uma visão mais analítica e questionadora dos fatos.

- Hoje, uma criança estuda por livros que questionam a realidade. Não se estuda mais que Pedro Álvares Cabral descobriu o Brasil. Fala-se do achamento da terra nova. Os portugueses sabiam da terra, mas não do tamanho nem das riquezas - exemplifica Werneck.

MEC avalia conteúdo didático a cada três anos

Para a análise dos livros didáticos de história, o Ministério da Educação seleciona 30 professores de todo o Brasil, todos funcionários de universidades públicas. São avaliados a metodologia de ensino-aprendizagem, os textos, ilustrações, exercícios e as atividades propostas que favorecem o desenvolvimento do pensamento autônomo e crítico. Para a professora Ana Maria Mauad, coordenadora adjunta da avaliação dos livros didáticos do ensino médio, as considerações finais foram muito positivas.

- Os livros atuais estão buscando uma renovação da forma do discurso, estão mais dinâmicos, evitando os conhecimentos cristalizados. É um processo em construção - avaliou Ana Maria.

Os livros do ensino médio são revisados a cada três anos. Os aprovados são redesenhados e publicados nos guias que são distribuidos às escolas. Segundo o MEC, os exemplares não podem "veicular preconceitos de qualquer espécie, ignorar as discussões atuais das teorias e práticas pedagógicas, repetir estereótipos, conter informações e conceitos errados ou análises equivocadas, ou ainda, contrariar a legislação vigente".

O livro do ensino médio deve ampliar os conhecimentos adquiridos ao longo do ensino fundamental; oferecer informações capazes de contribuir para a inserção dos alunos no mercado de trabalho, o que implica a capacidade de buscar novos conhecimentos de forma autônoma e reflexiva. O MEC conclui que "a escolha do livro deve ser criteriosa e afinada com as características da escola, dos alunos e com o contexto educacional em que estão inseridos".

Ensino Fundamental

Já a avaliação dos exemplares destinados ao ensino fundamental é feita cada quatro anos. O conteúdo deve contribuir para a formação intelectual e cultural dos estudantes; . favorecer o conhecimento de diversas sociedades historicamente constituídas, por meio de estudos que considerem múltiplas temporalidades; e propiciar a compreensão de que as histórias individuais e coletivas se integram e fazem parte da história.

Nenhum comentário: