Fernanda Thurler - JORNAL DO BRASIL
A força aérea de Israel preparou uma operação de surpresa, os aviões inflectiram para o sul para atacar, simultaneamente, alvos árabes. Por terra, 235 mil militares armados preparam-se para a ofensiva. O cenário de guerra é o mesmo de hoje, a Faixa de Gaza, os envolvidos também, mas aconteceu em 1967, na famosa Guerra dos Seis Dias. Este é um fato relatado em todos os livros didáticos e ensinado aos alunos como um acontecimento referente a um passado acabado, sem uma correlação com o presente. Mas esta metodologia não é aprovada pelos historiadores consultados pelo Jornal do Brasil. Para a professora Ana Maria Mauad, doutora em História Social pela Universidade Federal Fluminense (UFF), os educadores devem mostrar aos alunos, por exemplo, que o conflito deflagrado há 40 anos explica a guerra e as mortes de hoje.
- O presente devia buscar explicações no passado, mas os professores ensinam o conteúdo como simples quadros de desenvolvimento da humanidade sem relação com a atualidade - analisa Ana Maria. - A Orientação do Ministério da Cultura é de evitar o anacronismo e a naturalização dos conceitos.
A historiadora, que foi coordenadora adjunta da avaliação dos livros didáticos pelo MEC, explica que no primeiro segmento do ensino fundamental (1º ao 5º ano) a história é estudada junto com a geografia, na disciplina de estudos sociais. Quando os alunos passam para o segundo segmento (6º ao 9º ano), há ruptura total entre história e geografia. Esta metodologia segmentada, segundo Ana Maria, é reforçada durante os três anos do ensino médio:
- O vestibular engessa o ensino. As provas das universidades não estimulam o pensamento crítico do aluno, apenas a narração dos fatos. Na minha opinião é algo que tem de ser repensado. Este ensino enciclopédico dos fatos não desperta o interesse nos alunos. A escola deve ser criativa para produzir um conhecimento em que o aluno se sinta agente da história.
Livros didáticos
Sobre os livros didáticos, os mais antigos, segundo o historiador Antônio José Barbosa de Oliveira, eram mais factuais, preocupados em contar a história dos fatos, as datas, os personagens.
- Era como um receituário para o aluno poder decorar - compara o professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). - Hoje, os livros de história estão mais contextualizados. Isso não significa que não sejam importantes nomes e datas, é fundamental ter a clareza dos acontecimentos e da cronologia para mostrar que a gente faz parte de um processo de continuidade e de rupturas. Mas há que se que buscar associações. Ao falar da quebra da bolsa de valores de Nova York, em 1929, o professor pode comprar com o que acontecia no Brasil no mesmo período, era o fim da República Velha e da política de exportação de produtos agrícolas.
Oliveira destaca que não tem como fugir muito das aulas expositivas, mas que a tecnologia pode ser um importante instrumento para atrair o aluno.
- Os filmes ajudam bastante, mas para gostar de história é imprescindível o prazer pela leitura - ressalta. - Todos os demais recursos são complementares.
Apesar de segmentado, segundo o pedagogo e autor de livros sobre educação, Hamilton Werneck, o ensino de história está mais crítico. Ele explica que os livros didáticos antigos retratavam o fato sob a ótica portuguesa. Já os mais recentes passaram a reconhecer a colônia, o país subdesenvolvido também como fazedor da história. Além disso, para Werneck, o que direciona os professores de hoje é a corrente francesa Les Annales, uma visão mais analítica e questionadora dos fatos.
- Hoje, uma criança estuda por livros que questionam a realidade. Não se estuda mais que Pedro Álvares Cabral descobriu o Brasil. Fala-se do achamento da terra nova. Os portugueses sabiam da terra, mas não do tamanho nem das riquezas - exemplifica Werneck.
MEC avalia conteúdo didático a cada três anos
Para a análise dos livros didáticos de história, o Ministério da Educação seleciona 30 professores de todo o Brasil, todos funcionários de universidades públicas. São avaliados a metodologia de ensino-aprendizagem, os textos, ilustrações, exercícios e as atividades propostas que favorecem o desenvolvimento do pensamento autônomo e crítico. Para a professora Ana Maria Mauad, coordenadora adjunta da avaliação dos livros didáticos do ensino médio, as considerações finais foram muito positivas.
- Os livros atuais estão buscando uma renovação da forma do discurso, estão mais dinâmicos, evitando os conhecimentos cristalizados. É um processo em construção - avaliou Ana Maria.
Os livros do ensino médio são revisados a cada três anos. Os aprovados são redesenhados e publicados nos guias que são distribuidos às escolas. Segundo o MEC, os exemplares não podem "veicular preconceitos de qualquer espécie, ignorar as discussões atuais das teorias e práticas pedagógicas, repetir estereótipos, conter informações e conceitos errados ou análises equivocadas, ou ainda, contrariar a legislação vigente".
O livro do ensino médio deve ampliar os conhecimentos adquiridos ao longo do ensino fundamental; oferecer informações capazes de contribuir para a inserção dos alunos no mercado de trabalho, o que implica a capacidade de buscar novos conhecimentos de forma autônoma e reflexiva. O MEC conclui que "a escolha do livro deve ser criteriosa e afinada com as características da escola, dos alunos e com o contexto educacional em que estão inseridos".
Ensino Fundamental
Já a avaliação dos exemplares destinados ao ensino fundamental é feita cada quatro anos. O conteúdo deve contribuir para a formação intelectual e cultural dos estudantes; . favorecer o conhecimento de diversas sociedades historicamente constituídas, por meio de estudos que considerem múltiplas temporalidades; e propiciar a compreensão de que as histórias individuais e coletivas se integram e fazem parte da história.
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