segunda-feira, 13 de maio de 2019

A FICÇÃO, O ESQUECIMENTO E A REESCRITA DA HISTÓRIA

Imagem capturada em: https://www.aficionados.com.br/thanos-melhor-vilao-marvel/
Um dos grandes acontecimentos midiáticos do ano de 2019 foi o lançamento do filme "Vingadores, Ultimato", que arrastou multidões para os cinemas. Ao assisti-lo pela segunda vez, chamou-me a atenção uma parte bem no final na qual o vilão Thanos afirma que pretende refazer o universo e apagar a memória de todas as criaturas vivas, pois segundo ele, enquanto houver quem se lembre de como era, haverá aqueles que não aceitarão a perda e resistirão.

De todas as cenas apoteóticas mostradas durante a mega produção cinematográfica, esta ficou gravada na minha mente e arrisco dizer que ela vale por todo o filme. Thanos está certo, pois enquanto houver a memória, haverá a resistência. Por isso o tirano desejava apagá-la definitivamente.  

Mas não é isso que os tiranos fazem? 

Para um tirano a história e a memória são suas inimigas. A memória por dar suporte à experiência coletiva, ao vivido, já que memória é vida. A história por ser não apenas o registro dos fatos mas, acima de tudo, promover o debate e a reflexão acerca deles. Os tiranos vão sempre atacar a memória e a história e vão impor o esquecimento. Mas esquecer não é suficiente, é preciso reescrever a história, uma história baseada em "achismos" e não no conhecimento legítimo. 

A reescritura da história se baseia na negação do fato, no ocultamento do papel da coletividade, na marginalização de grupos inteiros e da minimização do papel de atores sociais importantes pelo seu engajamento em lutas. O apagamento das lutas e o sentido das conquistas realizadas ao longo dos anos pelo povo, pois o cidadão comum, é ele que os tiranos temem, pois é dele que tiram seu poder.

Neste processo, todos aqueles capazes de questionar, todos aqueles que são portadores de conhecimento, se tornam inimigos do Estado autoritário. Professores, filósofos e cientistas são comparados a terroristas. São acusados de doutrinação, de ensinar inverdades, de serem tendenciosos. A verdade é monopólio dos tiranos, que a tomam como sua e absoluta. Uma verdade que se impõe pela força, pela violência moral e física, pela vulgarização, banalização e abandono das ciências e de seus templos, escolas e universidades.

A ficção nos oferece uma representação do mundo que estamos vivendo, no qual grupos radicais têm  como um projeto global reescrever a história e apagar a memória. Essa reescritura se faz necessária para que não haja  a tão temida crítica, o questionamento da sociedade com relação aos rumos que estão tomados na direção da construção de uma sociedade que privilegia a poucos e segrega a muitos. Se não há memória e história não há resistência e os tiranos triunfam e deixamos de ser cidadãos para nos tornarmos súditos cuja própria existência é desejo (ou não) do Estado.  

3 comentários:

Unknown disse...

É uma verdade.Estamos cercados de vilões.

Unknown disse...

Você é uma ótima escritora.
Obrigada por esse texto. Muito são especialmente partindo do ponto de vista de uma ficção mas transpondo para a realidade.

Unknown disse...

Excelente texto. Uma análise dos novos tempos.