domingo, 13 de outubro de 2024

COMENTANDO THE DOBLE (墨雨云间)

Faz um bom tempo que eu não posto nada sobre as séries orientais que eu assisto. Um pouco pela falta de tempo, que me faz priorizar outras coisas, mas, principalmente porque nada havia até agora me impressionado ao ponto de eu querer escrever algumas palavras. Até que assisti The Double (墨雨云) ou Peões do amor, um drama chinês, no Netflix. O termo "peão" utilizado no drama se refere à uma peça de xadrez, que equivale a um soldado. O peão é usado e descartado de acordo com a estratégia do jogador.

Dos dramas orientais, os chineses não estão, normalmente, no primeiro lugar das minhas escolhas. Mas este ano percebi que foram eles que prenderam mais a minha atenção do que os coreanos. E eu fiz questão de assistir em etapas, para não correr o risco de perder uma só cena. Foram 40 capítulos tão bem aproveitados que poderiam ter sido 80 que eu não reclamaria.

O drama é baseado no romance de nome Marriage of Di Daughter  (O casamento da filha e Di), de Qian Shan Cha Kee, e  conta a história de Xue Li, a filha do Magistrado Xue, que foi traída e enterrada viva por seu  marido, Shen Yurong. Mas o destino lhe dá uma segunda chance quando ela é  salva por Jiang Li, a filha do Secretariado Chefe do reino, enviada para uma casa de recolhimento (uma espécie de convento) nas montanhas, ainda menina, acusada pela madrasta por um crime que não havia cometido. Por conta dos maus tratos que sofria, Jiang Li falece e seguida, mas antes de morrer ela pede a Xue Li para se vingar por ela. Xue Li assume a identidade de Jiang Li e usando sua inteligência privilegiada, vai para a capital para buscar vingança contra aqueles que causaram o sofrimento dela e de Jiang Li. 

The Doble é um drama muito complexo, com uma narrativa muito densa, e que está longe de ser uma trama de romance superficial. É uma história que gira em torno de crime e vingança. Da busca por reparação. A história tem personagens que foram minuciosamente construídos dentro de um enredo que envolve traumas psicológicos e muita conspiração e luta pelo poder, numa teia de relações palacianas. Entre as relações de poder presentes na trama temos também relações de gênero.

A violência contra as mulheres está presente a todo momento. Elas são vítimas do patriarcado, usadas e desacatadas por seus maridos, pais e irmãos. Elas sofrem violência física e moral. Mas elas revidam, cada uma a sua maneira. Entre vilãs e mocinhas, todas têm em comum o fato de terem sido usadas como "peões" pelos homens, e tentado sobreviver da forma como suas mentes abaladas e traumatizadas conseguiram. Umas respondem à injustiça buscando denunciar e exigindo punição. Outras respondem a opressão sofrida se tornando elas próprias opressoras. São essas mulheres que o tempo todo ditam o ritmo da narrativa.

Podemos destacar a protagonista, Xue Li/Jiang Li, interpretada pela atriz Wu Jinyan. Inteligente, sensata, ela havia se sacrificado pelo marido, Shen Yurong, homem de origem humilde, que desejava ascender na corte. Traída e abandoada, ela deixa de lado o papel de esposa submissa, que suportava os maus tratos da sogra e da cunhada e dá a volta por cima. Na busca por reparação para ela e sua salvadora, então falecida, a jovem acaba se envolvendo com o nobre Duque Su, Xiao Heng , interpretado pelo jovem ator Wang Xingyue. Ambos dão um show de interpretação. Cabe destacar que a atriz Wu Jinyan chegou a ser vítima de etarismo ( termo que se refere à discriminação, preconceito e estereótipos direcionados a pessoas com base na sua idade. Também é conhecido como idadismo ou ageísmo) por ter como par romântico um ator de 22 anos, quando ela possuía 34 anos.

As antagonistas também são excelentes, com destaque para a princesa Wan Ning, interpretada por Li Meng. Dada como refém a um reino inimigo, a princesa Wan Ning passou por uma série de abusos físicos e morais que a levaram a buscar a reparação por meio da violência e opressão. Psicologicamente afetada pelos anos de cárcere, é uma mulher cuja dor e o sofrimento são incompreendidos por quem a cerca. A atriz Li Meng teve uma atuação maravilhosa na trama. Ela consegue atrair a antipatia do público e, à mediada que sua história vai sendo revelada, não há como não sentir empatia por uma mulher que passou por tantos percalços, sempre usada pelos homens.

Não gosto de dar spoilers, então encerro dizendo que além de uma história envolvente, The Doble é também uma produção que esmera pela fotografia, pela trilha sonora e pelo figurino, impecáveis. Recomendo assistir.


Um comentário:

  1. Ao ler suas impressões, me deixaram com vontade de assistir. Logo, adorei sua resenha.

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